Brasao TCE TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO TOCANTINS
GABINETE DA 4ª RELATORIA

   

11. VOTO Nº 65/2023-RELT4

11.1. Conforme já consignado no Relatório, trata-se de Recurso Ordinário interposto por Inácio Alves da Conceição, Presidente do Fundo Municipal de Saúde de Carrasco Bonito/TO, em face do Acórdão nº 632/2021-TCE/TO – Segunda Câmara, exarado nos Autos nº 12623/2019, no qual este Tribunal de Contas julgou a Auditoria de Regularidade, referente ao período de janeiro a agosto de 2019, e aplicou multa ao recorrente.

11.2. A matéria em comento é disciplinada nesta Corte de Contas nos termos do art. 46 e ss. da Lei nº 1.284/2001 c/c arts. 228 e 229 do Regimento Interno deste Tribunal.

11.3. O recurso em referência foi protocolizado dentro do prazo, em conformidade com o art. 47 da Lei n° 1.284/2001, segundo se depreende da Certidão nº 3354/2021-SEPLE, posto que foi autuado pelo interessado em 21/10/2021 (quinta-feira), sendo a deliberação rebatida disponibilizada no Boletim Oficial do TCE/TO nº 2868, de 01/10/2021 (sexta-feira), com publicação em 06/10/2021 (quarta-feira).

11.4. Tem-se que restam satisfeitos os requisitos de admissibilidade recursal, quais sejam, o cabimento da espécie recursal, a legitimidade, o interesse para recorrer, a tempestividade e a regularidade formal, de igual sorte a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, motivo pelo qual a matéria em questão pode ser enfrentada por meio de Recurso Ordinário, em consonância com o que estabelecem os arts. 228 a 331 do RITCE/TO.

11.5. Dessa forma, baseando-se nas informações que constam dos presentes autos, confrontando com os fatos apresentados no Relatório de Auditoria, passa-se, a seguir, à análise meritória.

11.6. Frente ao “Item 9.3 do Acordão TCE/TO nº 632/2021 – Segunda Câmara, “a) 1 - Ausência da Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (REMUME) (...) item (2.1) ”, os recorrentes alegam o que segue: “(...) os apontamentos que motivaram a aplicação de multa não merecem subsistir, eis que os fatos narrados não correspondem com a realidade vivenciada no município a época da auditoria.”.

11.7. Pois bem. Sem a finalidade de esgotar a temática, mas apenas de contrastar o apontamento, ensejador de multa por esta Corte de Contas, e a justificativa apresentada pela recorrente, é necessário reiterar, em conformidade com o VOTO Nº 82/2021-RELT2, item 9.2.4 (tabela), o seguinte:

Portaria nº 3916, de 30 de outubro de 1998, sobre a Política Nacional de Medicamentos, no item 5.4, “h”, aponta que é responsabilidade do gestor municipal “definir a relação municipal de medicamentos essenciais, com base na RENAME, a partir das necessidades decorrentes do perfil nosológico da população”. A Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (REMUME) é instrumento fundamental para orientar a organização de todas as etapas da Assistência Farmacêutica, especialmente as prescrições médicas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), a atender, de forma coerente, a demanda reprimida das pessoas necessitadas, a aprimorar o planejamento das ações do SUS, e a melhorar o processo de controle das demandas. (Grifou-se)

11.8. A Portaria de Consolidação nº 2 do Ministério da Saúde (Gabinete do Ministro), de 28 de setembro de 2017, ratifica as normas sobre as políticas nacionais de saúde do Sistema Único de Saúde, em que consta o Anexo XXVII - Política Nacional de Medicamentos - PNM (Origem: PRT MS/GM 3916/1998, Anexo 1), com o seguinte teor:

5. RESPONSABILIDADES DAS ESFERAS DE GOVERNO NO ÂMBITO DO SUS
No que respeita às funções de Estado, os gestores, em cumprimento aos princípios do SUS, atuarão no sentido de viabilizar o propósito desta Política de Medicamentos, qual seja, o de garantir a necessária segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, a promoção do uso racional e o acesso da população àqueles considerados essenciais.
(...)
5.4. Gestor municipal
No âmbito municipal, caberá à Secretaria de Saúde ou ao organismo correspondente as seguintes responsabilidades:
(...)
h. definir a relação municipal de medicamentos essenciais, com base na RENAME, a partir das necessidades decorrentes do perfil nosológico da população; (grifou-se)
 

11.9. Quanto à RENAME – trata-se da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais e, de acordo a edição de 2022, do Ministério da Saúde, cumpre o papel de “relacionar os medicamentos utilizados no âmbito do SUS.”.

11.10. Outrossim, destaca-se mais o Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011, que regulamenta a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, dispõe que “a RENAME compreende a seleção e a padronização de medicamentos indicados para atendimento de doenças ou de agravos no âmbito do SUS” e também que “a cada dois anos, o Ministério da Saúde consolidará e publicará as atualizações da Rename e do respectivo FTN (Formulário Terapêutico Nacional) ”.

11.11. Em outras palavras, haja vista que no município de Carrasco Bonito/TO não há Secretaria de Saúde, mas apenas o Fundo Municipal de Saúde, a responsabilidade pela definição da Relação Municipal de Medicamentos Essenciais – REMUME, com base na RENAME, é de seu gestor, logo, tem-se também a necessidade de esclarecer, a seguir, que o Sistema Nacional de Gestão de Assistência Farmacêutica – HÓRUS, por si só, não substitui a finalidade da REMUME.

11.12. Veja-se, a Portaria nº 1.555, de 30 de julho de 2013, dispõe sobre as normas de financiamento e de execução do Componente Básico da Assistência Farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, trazendo em seu artigo 13 o seguinte: “Para dar suporte à gestão da Assistência Farmacêutica na Atenção Básica à Saúde, o Ministério da Saúde disponibiliza aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios o Sistema Nacional de Gestão da Assistência Farmacêutica - HÓRUS”.

11.13. Do mesmo modo, do sítio do Ministério da Saúde se extrai que o Sistema Nacional de Gestão da Assistência Farmacêutica – HÓRUS, foi desenvolvido pelo Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde (DAF/SCTIE/MS) com a seguinte finalidade: “qualificar a gestão da Assistência Farmacêutica nas três esferas do SUS, e contribuir para a ampliação do acesso aos medicamentos e da atenção à saúde prestada à população (...)”.

11.14. Ante todo o exposto nos itens 11.07 a 11.13 do presente voto, reitera-se que a REMUME diz respeito à relação municipal de medicamentos essenciais e tem a finalidade de, com base na RENAME, selecionar e padronizar os medicamentos essenciais à saúde da população municipal dentro de suas especificidades/conjunto de doenças prevalentes.

11.15. Por outro lado, o Sistema Nacional de Gestão da Assistência Farmacêutica – Hórus, é ferramenta tecnológica que visa cooperar com os gestores do âmbito da saúde no que tange à qualificação da assistência farmacêutica e à transparência dos serviços prestados.

11.16. Assim, o referido sistema contribui para o planejamento dos serviços, mas não substitui o respaldo da REMUME como “instrumento fundamental para orientar a organização de todas as etapas da Assistência Farmacêutica, especialmente as prescrições médicas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), a atender, de forma coerente, a demanda reprimida das pessoas necessitadas, a aprimorar o planejamento das ações do SUS, e a melhorar o processo de controle das demandas.”. (VOTO Nº 82/2021-RELT2).

11.17. Em sua defesa, o senhor Inácio Alves da Conceição – Presidente do Fundo Municipal de Saúde de Carrasco Bonito/TO, traz, como suporte probatório, a publicação no Diário Oficial do Município nº 248, da Lei Municipal nº 341, de 30 de dezembro de 2019, que dispõe sobre a aprovação da Relação Municipal de Medicamentos Essenciais Remume e a criação Comissão Municipal de Farmacologia, Diagnóstico e Terapêutica no Âmbito da Secretaria Municipal de Saúde, e dá outras providências.

11.18. De igual sorte, em mesma edição do citado Diário Oficial, consta a Lista de Medicamentos Remume 2019/2020, anexo I.

11.19. Ainda que resta assente, a providência tomada quanto ao cumprimento da falha apontada acima, tal suporte probante não sana a irregularidade, dado que tanto a destaca Lei, como a lista em tela foram editadas após a auditoria realizada em Carrasco Bonito, cuja fiscalização se deu no período de janeiro a agosto de 2019, de modo que tanto Lei Municipal nº 341/2019, quanto a Lista de Medicamentos Remume 2019/2020, foram entraram em vigor em 14 de janeiro de 2020, data da publicação do mencionado veículo oficial, logo, se verifica que quando da fiscalização não haviam tais instrumentos instituídos.

11.20. Importa, ainda, destacar que a decisão que se propõe acerca da matéria, tem baliza em precedentes deste Tribunal, a exemplo de excertos extraídos do Voto 114/2021, parte integrante do Acórdão 683/2021, do Processo 12615/2019 – 2RELT:

A Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (REMUME) é instrumento fundamental para orientar a organização de todas as etapas da Assistência Farmacêutica, especialmente as prescrições médicas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), a atender, de forma coerente, a demanda reprimida das pessoas necessitadas, a aprimorar o planejamento das ações do SUS, e a melhorar o processo de controle das demandas.
Assim sendo, pela ausência da Relação Municipal de Medicamentos Essenciais e dos itens elencados no Relatório, aplico multa à ex-gestora do Fundo Municipal de Saúde, responsável pela elaboração do aludido instrumento, sendo razoável exigir conduta diversa do responsável. 

11.21. Dessa forma, apontar que à época o Fundo Municipal de Saúde de Carrasco Bonito utilizava o Sistema Hórus não elide a necessidade de se cumprir as normas sobre as políticas nacionais de saúde do SUS, especialmente quanto à responsabilidade de elaboração da REMUME, motivo por que afasto as razões de defesa apresentadas pelo recorrente, mantendo, portanto, a irregularidade acima, ensejadora de multa, segundo disposto no Acórdão recorrido.

11.22. Passa-se à análise do “Item 9.3, “a”, do Acórdão TCE/TO nº 632/2021, conforme segue:

2 - Controle de medicamentos adquiridos em decorrência de decisões judiciais; 3 - Controle de demandas reprimidas (não atendidas) de medicamentos; 4 - Programação de compra; Padronização de especificações técnicas; 5 - Norma de pesquisa de preço; 6 - Rotinas de prevenção de fraudes e conluio; 7 - Inventário físico do período (item 2.1).”.

11.23. Diante desses apontamentos, o recorrente se reservou em apresentar a sucinta defesa:

Nos mesmos termos das alegações de defesa em manifestação preliminar, o recorrente sustenta que os apontamentos que motivaram a aplicação de multa não merecem subsistir, eis que os fatos narrados não correspondem com a realidade vivenciada no município a época da auditoria. Dessa foram, para comprovar o adimplemento do objeto dos apontamentos que acarretaram multa, anexo junto ao presente recurso os documentos comprobatórios da relação de medicamentos e os demais documentos de controle que careceu na defesa preliminar.
Analisando os documentos em anexo, restará comprovado que não houve descumprimentos das normas, tampouco prejuízo ao erário público do município de Carrasco Bonito/TO. (Conforme original)

11.24. Relativamente a estes apontamentos (Controle de medicamentos adquiridos em decorrência de decisões judiciais; Controle de demandas reprimidas [não atendidas] de medicamentos; Programação de compra; Padronização de especificações técnicas; Norma de pesquisa de preço; Rotinas de prevenção de fraudes e conluio; Inventário físico do período [item 2.1])”, constata-se que a defesa apresentada pelo Recorrente se apresenta como narrativa, sem, portanto, ilidir os pontos inquinados como irregulares.

11.25. Para além disso, se reserva em aduzir que a documentação anexa seria suficiente para suplantar tais irregularidades.

11.26. Diversamente do que alega o Recorrente, - diga-se de passagem que as razões de tal recurso se restringem a seis parágrafos, dispostos em pouco mais de uma página - , a relação acostada ao Recurso, a qual apenas traz planilhas, contendo nome do medicamento, datas de entrada e saída, quantidade, valor etc., contudo, sem nenhuma assinatura do responsável pelo controle de estoque, gestor ou responsável afim, enfim, tais planilhas, pelo seu característico informal, não tem o condão de fazer face a sanar tais irregularidades.

11.27. De mais a mais, as inconsistências acima, são providências mínimas que devem ser tomadas e/ou implementadas por uma Unidade Jurisdicionada conforme a que se examina, tratando-se de condições quase sine qua non afeta a rotina mínima necessária na conduções e prestação do múnus público.

11.28. Logo, aliada a falta da REMUME, os demais elementos são igualmente importantes para controlar não apenas a demanda, mas também para serem elementos fundamentais no planejamento e estruturação da proposta orçamentária.

11.29. Quanto ao item “b) 1 - Armazenamento inadequado dos medicamentos da farmácia (...) e 3 - falta de medicamentos (item 2.1.9) ”, o recorrente deixou de apresentar qualquer documento que esclareça a situação descrita no RELATÓRIO DE AUDITORIA Nº 21/2019, daí por que se mantém tal irregularidade.

11.30. Todavia, para reforçar a tese albergada, quanto a irregularidade acima, cita-se precedentes deste TCE:

PROCESSO 12615/2019

VOTO 114/2021- 2RELT
A Portaria 3916/98 (Política Nacional de Medicamentos), no item 5.4, “m”, aponta que é responsabilidade do gestor municipal “receber, armazenar e distribuir adequadamente os medicamentos sob sua guarda.”.  Além deste dispositivo, é abundante a existência de parâmetros em regulamentos normativos sobre o tema, principalmente advindo da ANVISA. A Resolução – RDC (Resolução da Diretoria Colegiada do Sistema de Vigilância Sanitária) nº 44, de 17 de agosto de 2009, atualizada pela RDC nº 41 de 2012, trazem todos os apontamentos que deveriam ser transformados em Protocolos, Orientações e Práticas no Município. Ainda tratando sobre amparo normativo, deve-se destacar, a RDC nº 304 DE 2019, também da ANVISA, que é específica clara sobre “Boas Práticas de Distribuição, Armazenagem e de Transporte de Medicamentos”. O Relatório aponta para o estado de mal conservação de elementos essenciais na estrutura do prédio que atingem a qualidade dos medicamentos e, por conseguinte, a regularidade da prestação dos serviços de saúde.

11.31. No que concerne a “b) 2 - ausência de controle de estoque”, em que pese o recorrente haver sustentado a utilização do sistema Hórus, igualmente não apresentou qualquer tipo de documento que comprove essa utilização (dados, registros e/ou imagens), consequentemente a justificativa também não se mostra suficiente para conduzir esta Corte de Contas a decidir pelo afastamento da multa aplicada em relação ao 1 -armazenamento inadequado dos medicamentos da farmácia, 2 - ausência de controle de estoque e 3 - falta de medicamentos (item 2.1.9).

11.32. Diante de tal impropriedade a Segunda Câmara desta Corte de Contas, em reiteradas decisões, reprime com aplicação de multa, a exemplo do ACÓRDÃO 683/2021, publicado no Boletim Oficial TCE/TO nº 2881 em 27/10/2021 e ACÓRDÃO 661/2021, publicado no Boletim Oficial TCE/TO nº 2878 em 22/10/2021, motivo pelo qual mantém-se tal irregularidade.

11.33. Finalmente, analisando as razões do recurso se verifica que não foram apresentados aos autos documentos capazes de atestar os argumentos invocados diante dos fatores que resultaram na aplicação de multa, posto que o recurso em questão, se resume em apenas duas páginas contendo a narrativa da defesa e a parte dispositiva, o qual não se mostra suficiente para ilidir tais irregularidades.

11.34. Assim, sigo o entendimento adotado na Análise de Recurso nº 47/2022 – COREC (evento 9), no sentido de que as razões apresentadas não são capazes de reformar a decisão atacada.

11.35. Por todo exposto, acolhendo a manifestação do Ministério Público de Contas, VOTO no sentido de que este Tribunal de Contas adote as seguintes providências:

11.36. Conheça o Recurso Ordinário interposto pelo senhor Inácio Alves da Conceição, Presidente do Fundo Municipal de Saúde de Carrasco Bonito, uma vez presentes os pressupostos de admissibilidade, com fundamento no art. 42, I e 46, da Lei nº 1.284/2001  para, no mérito, negue-lhe provimento, mantendo incólumes os termos do Acórdão nº 632/2021-TCE/TO – Segunda Câmara, exarado nos Autos nº 12623/2019, determinando-se o seu integral cumprimento em razão da ausência de fundamentos e provas capazes de alterar a decisão recorrida.

11.37. Determine a publicação desta Decisão no Boletim Oficial deste Sodalício, nos termos do art. 27, caput, da Lei nº 1.284/2001 e do art. 341, § 3º, do RITCE/TO, para que surtam os efeitos legais necessários;

11.38. Após, sejam estes autos enviados à Coordenadoria do Cartório de Contas-COCAR, para as providências de sua alçada e, em seguida, remetê-los à Coordenadoria de Protocolo Geral-COPRO, para arquivamento, com as cautelas de praxe.

 

Documento assinado eletronicamente por:
LEONDINIZ GOMES, CONSELHEIRO-SUBSTITUTO, em 03/05/2023 às 16:07:39
, conforme art. 18, da Instrução Normativa TCE/TO Nº 01/2012.
A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://www.tceto.tc.br/valida/econtas informando o código verificador 280806 e o código CRC A5D1DC2

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